Blog da Vivian Whiteman

Bowie, o gênio da moda
Comentários Comente

Vivian Whiteman

Eu amo David Bowie. Pra mim ele é um dos grandes caras da história do mundo, não só da música. Porque, enfim, a boa música é uma das grandes maravilhas do mundo, refaz a realidade.

Bowie talvez seja um dos caras que melhor compreendeu o que é ser um astro pop. Desde muito cedo percebeu que a imagem e a música geravam uma química louca quando se metiam juntas nos palcos, principalmente naqueles onde se tocava rock.

Sua  fase glam, falando apenas das roupas, é ainda hoje uma das coisas mais sofisticadas que se fez em termos de moda em todos os tempos. Os figurinos das turnês de Ziggy Stardust e Aladdin Sane jamais foram superados. Talvez Madonna e Lady Gaga sejam as únicas a ter se aproximado disso. Mas sem alcançá-lo.

A questão não era supertecnologia, muito dinheiro nem nada disso. Além do mais, no final dos 60 e início dos 70, as marcas de moda não disputavam artistas com a mesma voracidade de hoje. E, saibam, muitos desses figurinos foram feitos por amigos de Bowie, gente que entendia o conceito e estava disposta a participar da festa.

Uma festa muito séria, apesar de toda a loucura, das drogas e da festa. Como todo grande artista da imagem, Bowie sempre zelou de perto pela construção de seus espetáculos, incluindo as roupas. Gente como Freddi Burretti e Natasha Korniloff. A mulher de Bowie, Angie, e até uma espécie de babá do filho do casal, Susie Frost.

As referências eram sofisticadas. Do top bailarino Nijinsky até o visual do filme ''Laranja Mecânica'', de Stanley Kubrick. Macacões, bodies, glitter, muito brilho. Muitas peças eram feitas de materiais baratos, às vezes copiadas de outras mais caras. Outras, eram confeccionadas com materiais encontrados em lojas estilo ''Tudo R$ 1''.

E.T., andrógino, mutante, sexualmente ambiguo. David Bowie simplesmente antecipou temas que viriam 10, 20, 30 anos depois de Ziggy Stardust. Não era só uma questão de estética, mas algo que dialogava diretamente com as letras, com a estrutura musical e também com o comportamento de toda uma geração.

Nos anos 80, Bowie mudou de personagem. Alguns disseram que ele havia se rendido ao mainstream, uma acusação acima de tudo, ingênua. Além de burra, é claro.

Bowie se apropriou de tudo. Dos yuppies, da nova vida moderna, do culto ao dinheiro. E botou tudo a favor de sua carreira, de maneira cínica quando foi necessário. Fez discos piores e melhores porque, de fato, a genialidade permanente é para os chatos. Os pontos baixos acabam empurrando os verdadeiros gênios a terrenos intocados. E se fez dinheiro com isso, tanto melhor para ele.

Bowie foi um imperador de outro mundo no filme ''Labirinto'', um vampiro delicioso em ''Fome de Viver'', sempre lindo, sempre impecável, um semideus de olhos diferentes. Pena que, por exigência de suas mulheres, consertou os dentes maravilhosamente assimétricos que só acentuavam sua beleza única.

Durante sua carreira, até hoje, vestiu peças de diversos estilistas. Um de seus preferidos, amigo pessoal: Alexander McQueen. Os grandes gênios, afinal, se reconhecem.

Bowie veste McQueen na capa do disco Earthling

E agora, dizem que Bowie está recluso e que pagam uma fortuna por uma foto dele. Ou seja, numa época em que todos fazem tudo para aparecer, Bowie mais uma vez saiu na frente. Ele ficou invisível. Sensacional.

Ai, sei lá. David Bowie, te amo.

Bjs

VW

PS: Ah é, tá rolando uma mostra de filmes dele em SP. Vai lá

http://festival.culturainglesasp.com.br/

 


Carta aos novos jornalistas de moda (ou fashionistas, estudai!)
Comentários Comente

Vivian Whiteman

Dar aulas, pra mim, é um grande prazer. Mais do que isso, é a oportunidade de dar às pessoas que se inscrevem uma coisa que me faltou em muitos cursos que fiz ao longo dos anos.

Recursos audiovisuais? Apostilas? Pencas de imagens? Não. Sinceridade.

Não é questão de encher a minha bola. Mas  o fato é que eu sempre pensei nisso simplesmente porque teria facilitado muito a minha vida: se um dia der aula, vou falar a verdade. Que tipo de verdade? A verdade da minha experiência, reportar o processo do meu trabalho a quem pudesse interessar.

Desde o meu primeiro estágio, aos 17, trabalhei com jornalismo. E vi muita coisa. E aprendi muita coisa, aprendo todos os dias. Durante a faculdade, me impressionava a distância entre o que os professores diziam e a realidade das redações. Chegava a ser ridículo.

Por isso sempre repito minha ladainha: procurem saber da real. Estudem além do cercadinho da moda. Desafiem. Perguntem. Leiam loucamente. Estudem mais. Olhem. Treinem o olhar diariamente. Saiam da casinha. Não tenham medo. Aprendam com os erros. Não se deixem intimidar. Tenham a coragem de pensar.

Neste mês dei um curso de jornalismo de Moda no espaço Cult. Em apenas dois dias, é limitado o que podemos fazer em termos práticos. Mas fizemos bastante.

Os alunos, a maioria jovens, foram ótimos. Interessados, questionadores, esforçados, animados. Conversamos abertamente, trabalhamos juntos. No segundo dia, depois de uma aula introdutória de muita teoria, explicações detalhadas sobre as etapas da construção de um texto, e choques de realidade, eles escreveram juntos uma crítica de moda a partir de um desfile.

A primeira análise para boa parte deles, feita em grupo, após ver o desfile em vídeo, pesquisar referências via Google e discutir. É claro que a coisa toda puxa para o meu modo de ver as coisas, mas o que vale não é isso, e sim eles terem compreendido COMO chego a certas conclusões, os caminhos que percorro em termos de perguntas, pesquisas e conflitos. A partir daí, cada um poderá começar a trilhar seus caminhos.

É muito difícil fazer textos em grupo. Escrevendo direto no telão. Discutindo com os colegas as questões de conteúdo e de estilo. Em algumas horas, eles conseguiram fazer um trabalho muito digno. Melhor do que muita coisa que se pretende profissional.

São moços e moças que logo estarão ou que acabaram de entrar no mercado. Gente interessada em aprender os processos em vez de engolir pura e simplesmente as regras desse ou daquele veículo. É preciso trabalhar e no mundo capitalista não há como viver acima do mercado. As regras são sempre do dinheiro. Mas precisamos formar gente capaz de entender essas regras. É o primeiro passo para subvertê-las.

Aos meus alunos desta e de outras turmas, obrigada. Obrigada por me ouvirem, obrigada por serem jovens e quererem algo mais do que aquilo que é imposto como bom ou possível.

Vocês arrasam.

Amor,

VW

 


15 Toques de Clarice
Comentários Comente

Vivian Whiteman

Talvez você não saiba, mas Clarice Lispector também foi jornalista. Ela trabalhou como colunista de moda, beleza e comportamento sob os pseudônimos  de Tereza Quadros (no jornal ''Comício'') e Helen Palmer (''Correio da Manhã'') e como ghost writer da atriz e modelo Ilka Soares (''Diário da Noite'').

As crônicas e conselhos jornalísticos de Clarice podem hoje parecer ultrapassados e até machistas. Foram publicados entre os anos 50 e 60. Porém, com um olhar mais atento, os leitores vão descobrir mensagens e entrelinhas que mudam o sentido das receitas mais banais. Era Clarice, inscrevendo seu estilo e sua visão de mundo entre as grades de colunas femininas direcionadas a donas-de-casa e com a missão de serem mesmo meio caretas.

Clarice, depois de uma vida aparentemente perfeita de mulher de diplomata, se divorciou e teve de se virar para cuidar dos filhos e da casa sem contar apenas com a ajuda do marido. Era uma das poucas mulheres a trabalhar dentro de redações na época.

Uma seleção dessas colunas foi publicada nos últimos anos nos livros ''Correio Feminino'' e ''Só Para Mulheres'', da editora Rocco. Recomendo para todos os fãs de Clarice e principalmente para moças e moços interessados em escrever sobre moda. Inspiração de estilo.

Aqui, reuni 15 das minhas passagens preferidas, que falam sobre moda e truques de beleza…ou não.

 

 

1  – “Tecnicamente, o preto é a inexistência” (sobre a volta do preto ao topo da moda)

2 – “Que lindas são as coisas antigas que se tornaram opacas e amarelecidas porque sobre elas passou a vida”

3 –  “Quando fazemos tudo para que nos amem…e não conseguimos, resta-nos um último recurso, não fazer mais nada” (na seção Aprendendo a Viver)

4 – “Mas o mesmo modelo, copiado para a vida diária, poderá perder a magia e tornar-se um trapo” (sobre copiar vestidos de filmes de cinema)

5 – “No inverno, a mulher é mais feminina”

6 – “Unhas com esmalte descascado, dando a penosa impressão de cicatrizes ainda não curadas”

7 – “E peruca? Pois usavam perucas negras para conseguir “o estilo sensual do Nilo”

8 – “Não existe beleza em olhos adoentados”

9 – “O sinal de beleza era colado com amor perto dos lábios_ e então se chamava coquette” (sobre as modas pré-Revolução Francesa)

10 – “O sofrimento da jovem africana na ceva tem seu contraponto no da modelo, de quem se costuma exigir que seja “cabide humano” (sobre padrões de beleza, pra vocês saberem que vem de longe essa história…)

11 – “Algumas mulheres, felizmente poucas, relegam a faceirice a um plano secundário explicando esse desinteresse como “superioridade intelectual”. Nada mais falso” (sobre a faceirice feminina)

12 – “De um modo geral é melhor ter um perfume mais para seco do que para doce. A menos que seu tipo exija, pela sua doçura de índole e intenções, uma essência realmente doce” (sobre perfumes)

13 – “Apóie as palmas das mãos contra os olhos fechados. Imagine um monte de carvão. Então, imagine que um gato preto está subindo pelo monte de carvão”

14 – “Há mulheres de quem poderíamos dizer: não têm rosto. Na verdade, de tal modo a fisionomia está “submersa”, com traços indecisos e cores desbotadas, que lembra um quadro apenas esboçado e nunca terminado”

15 – “Cerque sua presença de um halo de perfume e você estará se cercando de seu próprio mistério_você não estará mentindo, estará dizendo a verdade de um modo bonito”

 


Manual afetivo (e nada prático) para separar roupas
Comentários Comente

Vivian Whiteman

1 – Tire tudo dos armários e jogue em cima da cama. Absolutamente tudo, nem a mais imaculada calcinha deve ser inocentada

2 – Tire também todos os sapatos. Jogue todos eles no chão, em volta da cama. Não tenha muitos sapatos demais da conta. Imelda datou. Fique com os lindos, inclusive alguns que apertam, para olhar. As solas gastas são mapas,  leia.

3 – Separe espaço para duas pilhas. A pilha do sim e a pilha do não. O talvez não forma pilha.

4 – As coisas que ficaram pequenas vão para o não. Nunca mais será daquele tamanho.

5 – As coisas muito grandes também vão para o não. Em último caso, se existir algo muito especial, você pode reformá-la para o seu presente.

6 – Guarde algumas coisas inúteis. Mas só as que forem inutilmente essenciais. Num domingo inútil, a ficha pode cair.

 

7 – Separe por lembrança. Essa é a parte complexa. Exemplo 1: Roupa linda do primeiro encontro maravilhoso com o ex. Pilha do sim, se você já tiver superado. Pilha do não, se você ainda precisar de mais tempo com o corpo da lembrança.  Exemplo 2: Roupa que você passou pela via Crúcis : pilha do não! Manter santo Sudário não dá sorte, minha gente.

8 – Faça o que quiser com seu vestido de casamento, eu que não meto a minha colher nesse assunto. O meu eu usaria em casa.

9 – Separe coisas específicas para dar para familiares e amigas. Pense sobre as escolhas.

10 – Doe roupas em vez de sempre tentar conseguir dinheiro. Não doe lixo.

Faz favor de vestir o que ficou. E fique atentx para não ir atrás de novas aquisições só pra preencher o vazio do armário.  Não aguarde a tendência, mas saiba reconhecer os sinais.

 


Uma impressão em vermelho
Comentários Comente

Vivian Whiteman

Cosme e Damião

Metade da vida
Que até agora vivi foindo
e vindo de rodoviárias
Um dia assim dois caboclinhos
Com pinta de violeiros
As camisas idênticas
Na goma e na gola
Seguindo um pai
Dos cânticos, poltrona 23
Verso da ternura escondida
em bagageiros lotados
Prestes a desaguar quilômetros
A cor daquelas camisas


< Anterior | Voltar à página inicial | Próximo>